Perder o cônjuge é um dos momentos mais difíceis da vida. Para estrangeiros que vivem no Japão com um parceiro japonês, essa dor costuma vir acompanhada de uma série de obrigações legais e burocráticas que precisam ser resolvidas em prazos curtos. Por isso, especialistas recomendam que casais conversem sobre esse tema com antecedência, por mais desconfortável que isso pareça. Entender os desejos do parceiro e deixar tudo legalmente documentado pode aliviar parte da carga emocional e prática no momento da perda.
Quando uma pessoa morre no Japão, o hospital ou o médico responsável emite um atestado de óbito, chamado shibō shindansho. Esse documento oficial confirma a causa, data e local da morte, e costuma ser necessário em diferentes procedimentos. É recomendável solicitar cópias adicionais. Em seguida, o falecimento precisa ser registrado na prefeitura da cidade onde a pessoa residia, por meio da entrega de um formulário chamado shibō todoke. Esse registro deve ser feito em até sete dias após a morte. No mesmo momento, é preciso solicitar o maisō kyokashō, uma autorização legal para que o corpo seja cremado ou enterrado.
Com a morte registrada, o nome do falecido é retirado oficialmente do koseki, o registro familiar japonês. A partir disso, o viúvo ou viúva pode pedir uma certidão de óbito oficial, que será usada em trâmites como herança, cancelamento de contas bancárias, comunicação com seguradoras e encerrar contratos de serviços como eletricidade, internet ou telefonia. Esse processo pode ser demorado, e cada empresa tem prazos e exigências diferentes.
Outra etapa importante é notificar a Imigração. Mesmo que o cônjuge falecido seja japonês, a morte precisa ser informada ao setor de imigração em até 14 dias. Muitos estrangeiros vivem no país com o visto de cônjuge de cidadão japonês, e esse visto perde validade após o falecimento do parceiro. Para seguir no Japão legalmente, o estrangeiro precisa dar entrada no pedido de mudança de status de residência, apresentando documentos como o atestado de óbito, comprovante de nacionalidade do falecido, passaporte, cartão de residência e certidão de casamento. Se não fizer isso dentro do prazo, ou se o pedido for negado, a imigração pode conceder um visto temporário por atividades designadas, que permite concluir processos como a partilha de bens e a organização do espólio. Caso decida deixar o Japão, o estrangeiro tem até seis meses para sair do país de forma regular.
Outro ponto que costuma gerar dúvidas é a existência de testamento. No Japão, um testamento pode ser manuscrito ou feito em cartório. A versão manuscrita, conhecida como jihitsu shōyuigon, deve ser escrita à mão, conter nome, data e assinatura, mas pode ser contestada judicialmente se não seguir regras rígidas. Já o testamento registrado em cartório, chamado kōsei shōsho igon, tem validade legal mais forte, mas envolve custos. Se a pessoa falecida não deixou testamento, a herança será dividida conforme o Código Civil japonês, que reconhece o cônjuge como herdeiro legal. No entanto, o cônjuge viúvo tem até três meses para decidir se aceita a herança, assume apenas parte dela (em casos de dívidas) ou renuncia totalmente.
Vale lembrar que apenas casamentos registrados oficialmente são reconhecidos na legislação japonesa. Casais em união estável ou com parcerias homoafetivas formalizadas por certidões de parceria municipal não têm direito automático à herança. Nesses casos, o parente vivo mais próximo do falecido é quem herda e administra os bens, mesmo que não haja vínculo afetivo direto.
Lidar com a morte do parceiro já é, por si só, uma experiência extremamente difícil. Ter que enfrentar processos legais, prazos burocráticos e decisões importantes logo em seguida pode agravar ainda mais o sofrimento. Por isso, o mais indicado é que o casal se planeje, registre suas vontades legalmente e converse com profissionais especializados enquanto ainda há tempo. Preparar-se para esse momento não diminui a dor, mas pode tornar a travessia menos caótica.