Miriam Sakoda, brasileira residente no Japão desde os 17 anos, na região de Saitama, não imaginava o impacto que um toque casual embaixo do braço teria sobre sua vida. Era o final de 2018 quando sentiu um nódulo enquanto tomava banho. “Eu fui apalpando e senti esse nódulo debaixo das axilas,” lembra. A preocupação a levou a procurar um médico local, que fez exames de imagem e tranquilizou-a com o diagnóstico de um fibroadenoma, um tumor benigno. “Ele falou que era benigno, que não era para me preocupar”, relembra Miriam, e assim seguiu a rotina de sua vida.
No entanto, a inquietação permaneceu. Em 2019, uma dor leve persistia, e ela atribuía o incômodo ao fibroadenoma já diagnosticado. “Deve ser do fibroadenoma, não tenho que me preocupar”, pensava. Mas em maio daquele ano, uma dor mais intensa sob as axilas voltou a preocupar Miriam. Ela decidiu pesquisar e se tranquilizou ao ler que o fibroadenoma poderia doer nas mulheres durante o período menstrual. Passados alguns meses, entre setembro e outubro de 2019, o medo retornou, agora junto a uma crise de pânico. Quando colocou a mão sobre o peito, sentiu outro nódulo, dessa vez na mama. “Achei estranho… do outro lado não tinha”, explica.
Diante do desconforto, ela procurou um médico e, apesar da preocupação, este a acalmou: “Ele ainda falou que não ia ser nada”. Mas ao fazer a ecografia e a mamografia, o médico foi direto. Miriam precisava urgentemente procurar um hospital. O exame de biópsia não deixou dúvidas: câncer de mama. “Fiquei ruim. Eu tenho duas filhas, né? Pensei: ‘Vou morrer. O que vai ser das minhas filhas?’”.
O diagnóstico trouxe um período de tristeza e ansiedade para Miriam, que passou o primeiro mês quase sem sair da cama. “Eu não chorava, mas ficava mal, desanimada”, conta. O medo era maior por causa das filhas, então com 10 e 12 anos, que, segundo ela, “poderiam crescer sem a mãe”.
Com o diagnóstico confirmado, Miriam iniciou o tratamento em um hospital especializado em câncer. A mudança de ambiente hospitalar foi um alívio: “Quando cheguei ao hospital do câncer, o atendimento foi outra coisa. Foi nota mil.” Lá, ela sentiu que estava finalmente no lugar certo para enfrentar a doença. O médico, com quem ela desenvolveu uma relação de confiança, a acolheu de uma forma que Miriam nunca havia experimentado. “Ele me mostrou fotos de mulheres com mama reconstruída, e falou: ‘Vai ficar tudo bem, não se preocupe’.”
A comunicação era um desafio, pois, embora entendesse japonês, Miriam não dominava totalmente o idioma. Felizmente, contava com o apoio de uma tradutora brasileira no hospital. Seu marido, peruano, também deu suporte ao longo de todo o tratamento. Miriam foi submetida à cirurgia, seguida por oito sessões de quimioterapia e 31 de radioterapia, além de um longo tratamento com medicamentos que durará cinco anos. “O importante é eu estar curada”, afirma ela, que viu sua imunidade cair consideravelmente durante o tratamento, o que exigiu cuidados redobrados. Em uma ocasião, a baixa imunidade demandou injeções específicas, e o tratamento foi interrompido até a recuperação.
Para Miriam, a relação com o marido também ganhou nova profundidade durante a batalha contra o câncer. Ele foi um pilar de apoio constante, mesmo nos momentos em que ela perdeu os cabelos e as forças. “Ele falava: ‘Você está linda, você está maravilhosa’. Por tudo o que passamos, nossa relação se fortaleceu muito.”
O sistema de saúde japonês trouxe algumas surpresas. Se por um lado Miriam enfrentou diagnósticos equivocados e dificuldades para encontrar tratamento adequado, por outro, destacou o suporte financeiro oferecido a pacientes como ela. Mesmo pagando altos custos, Miriam pôde parcelar parte das despesas e teve auxílio para medicamentos e exames. “Aqui, se você não tem dinheiro, eles fazem a cirurgia primeiro. Isso é justo.”
Miriam afirma que, além do tratamento físico, o emocional também foi determinante para a cura. “Eu acho que a cura está muito na gente também.” Para ela, a doença foi um ponto de transformação. Ela passou a valorizar ainda mais cada momento ao lado das filhas e o suporte da família. “Eu tenho muita fé. Nunca abaixei a cabeça para a doença”, afirma, reconhecendo o impacto do câncer na sua vida e nas suas prioridades.
Após toda a experiência, Miriam fala da importância da prevenção com seriedade e convicção. “As mulheres, independente da idade, já têm que fazer exames, ou com o toque, ou procurar um médico.” Ela defende que o autoexame e as consultas frequentes são o segredo para a detecção precoce. Mesmo com o fim do mês de outubro, e consequentemente, dacampanha do Outubro Rosa, Miriam faz questão de reforçar que “a prevenção é o ano todo”.
Para Miriam Sakoda, o câncer trouxe uma batalha dura, mas também lições de vida que ela agora compartilha com outras mulheres. Seu maior sonho é concluir o tratamento e retornar ao Brasil, onde planeja reconstruir sua vida ao lado da família.